Os maiores são onze anos maiores, e são três. Às vezes eu
acho que eles consideram o irmão um boneco; valioso, com certeza, mas mesmo
assim um brinquedo. Natural, afinal quem tem irmãos, principalmente quem tem
irmãos muito mais velhos, sabe que essa provocação vem de épocas imemoriais.
Mas o pequeno não se intimida. Enfrenta os perigos de
atravessar a sala com bravura e geralmente consegue fazer valer sua vontade.
Não dessa vez. Nesse dia um dos maiores estava me mostrando
o trabalho de vitaminas feito para a escola. Bonito, os recortes de revista
colados na cartolina, cada vitamina associada a um grupo de alimentos, muitas
canetinhas, bem caprichado. O pequeno, porém, estava mais interessado em chamar
minha atenção, afinal eu tinha dito que minha visita era especialmente para ver
ele. Sem que percebêssemos, surgiu por trás da cartolina e puxou o trabalho da
nossa mão.
- Não! Não!
Assustado com a possibilidade de ver horas de trabalho em pedaços,
o maior pulou do sofá, tirou delicadamente das mãos do pequeno a cartolina e
correu para o quarto guardar. Quem nunca tremeu diante da tela azul da morte do
Windows que atire a primeira pedra. Parece, no entanto, que o pequeno não
entendeu assim. Ficou amuado por ter sido tão intempestuosamente barrado da
conversa. Foi para o outro lado da sala e logo já estava entretido com seus
brinquedos.
Ou foi o que pensei. Alguns minutos depois, já entretido
novamente na conversa com o trio, percebi que o menor estava apenas planejando
sua vingança de dominação mundial. Enquanto todos estavam distraídos, correu em
direção a cadeira em que repousava uma cartolina e jogou desafiadoramente tudo
no chão.
Acontece que esse trabalho não era o mesmo que havia causado
sua desonra. Esse era o do outro irmão, que nem estava presente no momento do
primeiro enfrentamento. O maior, indignado com a atitude vil e depropositada,
um ato de violência a seu ver completamente gratuito, correu em direção ao
pequeno e rugiu. Essa é a expressão certa, apenas rugiu, porque nem passou por
sua cabeça bater no pequenino.
- AAAAHHH!
- Tai, tai, tai – que é a interjeição predileta do pequeno para
afastar qualquer inimigo.
- AAAHH, AHHH, AAAAAH
- Taitaitaitaitaitai
Finalmente, depois de alguns momentos de suspense, o menor
finalmente cedeu e começou a chorar. Os gritos dos dois e as risadas da nossa
turma do sofá atraíram o pai, que só pegou a fotografia do desfecho, com o grande
rugindo ameaçadoramente para o bebê chorando.
- Foi ele que começou! – foi tudo que o maior conseguiu
dizer antes de correr para o quarto numa clara estratégia de contenção de
danos.
Eu apoiei a justiça:
- Foi sim, foi ele que começou, ele jogou o trabalho no chão
sem que o irmão tivesse feito nada.
E o pequeno, traído por quem julgava ser seu maior aliado,
acabou levando a bronca. O pai pegou ele no colo, enxugou suas lágrimas e
levantou a cartolina do chão.
- Seu irmão levou muito tempo para fazer esse trabalho, você
tem que tomar cuidado para não estragar. – explicou baixinho.
O pequeno entendeu que tinha perdido a disputa, mas não me
pareceu muito certo quanto a justiça da derrota. Já o maior nem percebeu que
tinha vencido e continuou emburrado durante a refeição, resmungando entre
garfadas sobre os perigos de atos terroristas sem sentido. O pequeno, também
emburrado, lançava olhares para o irmão que revelavam todo seu desprezo com
trabalhos de vitaminas para escola.
Não durou muito. Não sei exatamente como ou quando a paz foi
travada, mas ao final da refeição vi os dois juntos, brincando, o grande
fazendo o pequeno rir.
Eu gostei, acho que todos os pequenos e grandes conflitos
podiam ser assim. Porque nem sempre é errado ganhar no grito. Porque sempre o
mais forte tem que tomar cuidado para não agir com violência desproporcional,
mesmo que tenha que para isso sacrificar seu orgulho. Porque mesmo quando quem
ganha não se sente vitorioso e quem perde se sente injustiçado, mesmo quando
todos estão insatisfeitos, sempre tem que haver esperança de reconciliação.

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