quarta-feira, 16 de abril de 2014

Perícia (II)


- Oi Tavares, o que foi?
- Oi Doutora.
- Não me chama de doutora, o que foi?
- Cara amassada, hein?
- Tavares, são quatro da matina e esse é meu sétimo local essa noite. Fala logo o que eu estou fazendo aqui.
- Então doutora, o sujeito aí dessa casa tava meio alterado e insistiu pra gente chamar a senhora. Parece que alguma coisa deu errado.
- Não diga! Tavares, ninguém liga pra polícia quando as coisas dão certo. “Alô, polícia, estamos aqui em casa, todos dormindo tranquilos, manda por favor a perícia vir aqui para embalar nosso sono”. E você nem entrou pra ver o que era? E o que a imprensa está fazendo aqui?
- Ah, doutora, disseram que o cidadão aí é importante, de influência mesmo, aí eu achei melhor não me meter. A senhora sabe que tenho quatro bocas para alimentar em casa, não quero confusão pro meu lado. Que?? Não me olha assim!
- Tá, vamos resolver isso logo.

- Ah, finalmente, ainda bem que você chegou! Estava mesmo precisando de uma opinião profissional. Boa noite.
- Eu diria que está mais pra bom dia, se eu realmente pudesse encontar alguma coisa de “bom”. O senhor é o senhor...?
- Pode me chamar de Schrod. Estou a noite inteira dando voltas com esse problema.
- Então Sr. Schrod, o senhor pode me mostrar a cena do crime e me contar o que aconteceu.
- Não é bem uma cena de crime, é mais um experimento científico...
- Ah vá, mostra logo.
- Aqui.
- Uma caixa com cadeado? Essa é a cena do crime?
- Deixa eu explicar, tem um gato nessa caixa e
- O senhor prendeu um gatinho nessa caixa???
- Calma, junto com um frasco de veneno e um contador Geiger como gatilho.
- Deixa eu ver se entendi, o senhor prendeu seu bichinho de estimação nessa caixa minúscula COM. VENENO? E achou por bem chamar a polícia no meio da madrugada para mostrar seu brilhantíssimo experimento?! Senhor, por favor, abra essa caixa!
- Exatamente! Eu preciso de uma opinião profissional. A senhora acha que o gato está vivo ou está morto?
- Senhor, abre já essa caixa!!
- Mas a senhora não entende! Se eu abrir a caixa invalido toda a experiência. Eu preciso justamente entender se esse gato está vivo ou morto enquanto a caixa está fechada.
- Senhor, sua caixa está se mexendo!
- E isso prova o que?
- Senhor, pela minha experiência, se está se mexendo está vivo, se está fedendo, morto. Abra a caixa!
- Aha! E se estiver se mexendo e fedendo ao mesmo tempo?
- Então é porque o animal, vivo e apavorado, se cagou todo! Abre logo a caixa que eu estou mandando!
- Ou o gato está simultaneamente vivo e morto! Quod erat demonstrandum!
- Senhor, seu gato está GRITANDO! Daqui dá até pra entender: “Schrod, seu puto, me tira daqui!”. ABRE A CAIXA.
- Ah, senhora, não se preocupe com o gato. Ele nem existe, isso é só um experimento mental.
- Já deu! Ninguém merece! Ô Tavares, vem cá. Rebenta esse cadeado e abre essa caixa. E cuidado com o gato que vai pular de dentro. E com o veneno... E radiação? Cruzes, cada um que aparece... Leva esse sujeito pra delegacia e fala pro delegado autuar por maus-tratos aos animais. Vamos circular essa encrenca que eu que não vou aguentar maluco no meio da noite sozinha! E eu sonhando com o glamour da série de TV...

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